Entre gregos e troianos
Na quinta-feira passada foi finalmente lançado, em Paris, o famoso Atlas Histórico do Golfo Pérsico. Fruto de uma cooperação mais alargada entre a École Pratique des Hautes Études e a Universidade de Teerão, este livro prova, para os iranianos, como o Golfo sempre foi Pérsico - e não Arábico, como têm vindo a reivindicar os países da margem sul desse charco. Para nós os editores, a aparição do volume encerrou três anos de trabalhos bastante penosos (leia-se: #"&%#) com gente muito dura de roer. Se fazer um atlas é tão difícil com eles, como não será negociar a questão do programa nuclear...
A jornada de festas acabou com um jantar na sumptuosa embaixada iraniana de Paris. Sem álcool, claro ("jus de raisin rouge ou blanc, Monsieur?"), e com o habitual chicken kebab, desta feita distinto da versão standard por vir com um molho de limao e natas de inspiração francesa. Isto sob os olhares atentos dos ayatollahs Chomeini e Chamenei, devidamente arrumados ao fundo da sala, mas ainda assim bem visíveis. Glupp. Foi na véspera de eu voltar para os States, e só me lembrei desta coincidência no dia seguinte, ao embarcar para Los Angeles.
À chegada ontem à noite em L.A., os americanos perguntaram-me logo o que é que eu andava a tramar no Irão. Eu respondi apenas: "nada", e expliquei que visitar países exóticos fazia parte da minha profissão, sendo que a culpa era dos portugueses, que visitaram meio mundo no século XVI. Fizeram "hm". Depois, ao chegar a casa, tinha um tipo sentado num carro à minha porta, a olhar muito atentamente para mim e as minhas malas. Aí pensei eu também: "hm", mas depois lembrei-me que não valia a pena enervar-me, porque estes tipos sabem tudo sobre nós de qualquer maneira. Quando fiz o pedido de visto para vir cá no ano passado, já as senhoras da embaixada em Lisboa me chatearam por causa das minhas "actividades iranianas". Por que é que eles haviam de apagar o que quer que fosse do meu ficheiro? Ontem no aeroporto estavam a par do facto de eu ter um segundo passaporte, húngaro, e de ter feito a licenciatura em Portugal e o mestrado na Alemanha. Só faltava perguntarem se gostava mais do frango com ou sem molho de limão...
O que me fez ganhar a noite foi um oficial da Immigration Office que, no meio disto tudo, me perguntou com um sorriso maroto: "do you see any parallels between Portuguese imperialism and our present situation?". Eu, um tanto surpreendido e, de qualquer maneira, completamente zonzo depois de 12 horas no avião, respondi: "some overstretch, maybe..." Ainda não tinha acabado de dizer isto, já me estava a imaginar vestido de cor-de-laranja a gozar o sol de Guantánamo. Mas o homem apenas sorriu e disse: "you may be right - have a nice stay".
A jornada de festas acabou com um jantar na sumptuosa embaixada iraniana de Paris. Sem álcool, claro ("jus de raisin rouge ou blanc, Monsieur?"), e com o habitual chicken kebab, desta feita distinto da versão standard por vir com um molho de limao e natas de inspiração francesa. Isto sob os olhares atentos dos ayatollahs Chomeini e Chamenei, devidamente arrumados ao fundo da sala, mas ainda assim bem visíveis. Glupp. Foi na véspera de eu voltar para os States, e só me lembrei desta coincidência no dia seguinte, ao embarcar para Los Angeles.
À chegada ontem à noite em L.A., os americanos perguntaram-me logo o que é que eu andava a tramar no Irão. Eu respondi apenas: "nada", e expliquei que visitar países exóticos fazia parte da minha profissão, sendo que a culpa era dos portugueses, que visitaram meio mundo no século XVI. Fizeram "hm". Depois, ao chegar a casa, tinha um tipo sentado num carro à minha porta, a olhar muito atentamente para mim e as minhas malas. Aí pensei eu também: "hm", mas depois lembrei-me que não valia a pena enervar-me, porque estes tipos sabem tudo sobre nós de qualquer maneira. Quando fiz o pedido de visto para vir cá no ano passado, já as senhoras da embaixada em Lisboa me chatearam por causa das minhas "actividades iranianas". Por que é que eles haviam de apagar o que quer que fosse do meu ficheiro? Ontem no aeroporto estavam a par do facto de eu ter um segundo passaporte, húngaro, e de ter feito a licenciatura em Portugal e o mestrado na Alemanha. Só faltava perguntarem se gostava mais do frango com ou sem molho de limão...
O que me fez ganhar a noite foi um oficial da Immigration Office que, no meio disto tudo, me perguntou com um sorriso maroto: "do you see any parallels between Portuguese imperialism and our present situation?". Eu, um tanto surpreendido e, de qualquer maneira, completamente zonzo depois de 12 horas no avião, respondi: "some overstretch, maybe..." Ainda não tinha acabado de dizer isto, já me estava a imaginar vestido de cor-de-laranja a gozar o sol de Guantánamo. Mas o homem apenas sorriu e disse: "you may be right - have a nice stay".
1 Comentários:
É mais uma prova do deplorável estado dos serviços de informações americanos. O Dude, um historiador sonhador que é a distracção em pessoa, conseguiu topar o agente secreto que lhe puseram à porta. O gajo deve ter levado um cartaz...
AM
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