23 abril 2009

Quo vadis codex? - Génese e percurso histórico

Tempos houve que me senti uma mistura de Zandinga e Gabriel Alves. Não querendo candidatar-me à Câmara de Lisboa, optei por escrever sobre o presente e o futuro do livro. Aqui irei, gradualmente, depositar as minhas previsões. No final poderão encontrar os número do totoloto.


O livro está em mudança. Uma mudança física e conceptual, assente em novos pressupostos e nas realidades onde estamos inseridos. O que virá a ser o livro? Será algo diferente, ao qual numa centena de anos só reconheceremos o nome? E qual a rapidez com que se concluirá o ciclo no qual vivemos?


O «donde vimos e para onde vamos», que nos ocorre em múltiplas circunstâncias, aplica-se também a este objecto, e conceito, com o qual muitos se habituaram a conviver intimamente, o livro.



A necessidade burocrática de um registo escrito veio a dar origem às criações menos previsíveis, aos mundos mais improváveis, a um dos prazeres mais saborosos e a uma nova mundivisão. Tudo isto podemos encontrar nos diversos livros que hoje se encontram à nossa disposição; tal não invalida que o crescimento exponencial do conhecimento científico, de que hoje beneficiamos se deva, em boa parte, à disciplina proporcionada pela escrita.


Como Hillesund nos recorda, a passagem dos textos orais para a escrita visava precisamente torná-los mais duráveis, portáveis e exactos, contribuindo para que se ultrapassassem as barreiras espaciais e temporais (entre outras coisas as comunicações deixaram de ter de ser obrigatoriamente presenciais), e foi nesse momento que a comunicação verbal se tornou essencialmente visual. A própria estrutura mental da sociedade que é alterada, pelo que o impacto de algo que damos hoje por adquirido, a escrita, não é de todo despiciendo.


O aparecimento da escrita estimula uma reestruturação mental. É certo que num primeiro momento isso se restringe a uma reduzida minoria mas é um fenómeno que se alargará com o passar do tempo. Mais à frente veremos como a tipografia permitiria amplificar este fenómeno.


Por necessidades de memorização a comunicação pré-escrita era prolixa, redundante e agregativa. A escrita disciplinou o pensamento, tornando-o mais sintético e analítico, ainda que mais conservador.


Se o caminho até ao livro que conhecemos se iniciou com a criação de signos, a questão do suporte ocorre quase simultaneamente. Ao início, o ser humano adaptou-se aos materiais que a natureza lhe proporcionava, mas não tardou a criar e adaptar os que mais lhe convinha.


Tudo o que aceita uma fixação visual foi utilizado como suporte para a escrita. Contudo, nunca cessou a busca por aprimorar esse elemento fundamental para a leitura, de modo a fixar de modo mais duradouro o que se pretendia registar e facilitar o seu transporte. Esse tem sido o caminho, facilitar o manuseio, o transporte, e o próprio acesso. Assim, das tabuinhas mesopotâmicas passamos para os rolos em papiro egípcios, e destes para os codex. No mundo ocidental, entre toda uma panóplia de suportes (nunca houve um verdadeiro monopólio), o papiro assume um predomínio que tardará a perder, e que se prolongará até c.400 d.C. A sua durabilidade no Egipto, terra seca, não se estendia a outras paragens e, gradualmente, o pergaminho foi ganhando terreno, tornando-se dominante com a ascensão do codex do início do período medieval. A forma antecessora do livro tal como o conhecemos foi o rolo, difícil de manusear, ainda que fácil de transportar. Convertido em codex, o manuseio torna-se mais fácil, e a procura de informação avulsa, assim como a elaboração de notas que personalizam e enriquecem a obra, são facilitadas.


Com o passar dos tempos, o suporte, a forma e o modo de produção foram-se alterando gradualmente. O âmbito alargado com que se discute o livro nos dias de hoje, no modo de produção do texto, o tipo de suporte, e até a sua essência, é inédito. As transições deram-se sempre gradualmente, o oposto do que se passa hoje, em que tudo é posto em causa ao mesmo tempo.


O outro grande momento na história dá-se com a imprensa de Gutenberg, um verdadeiro agente de mudança, que libertando o livro da cópia manuscrita vai estimular a circulação de textos. A estrutura mantém-se igual à do manuscrito mais tardio, e de ele bebe as referências que o enobrecem ou credibilizam. O modo de produção altera-se com referentes muito próximos ao do estádio anterior, reproduzindo-se o que já tinha sido formalmente estabelecido mais de um milénio antes.


A impressão diminui a fragilidade do livro, cujos exemplares, até então, eram muitas vezes únicos, e vem estimular uma maior fixação da linguagem e o desenvolvimento do método científico. Com este tipo de solidificação em série começa a tecer-se uma unidade entre objecto, autor e obra.


O ciclo textual muda, separando-se a escrita da produção, e alargando-se a penetração do livro na sociedade. O ciclo de um texto escrito conhece a escrita, o conservar e a leitura. E quando escrevemos em papel estamos a conservá-lo, a acervá-lo, disponibilizando-o para os demais. O novo livro, impresso, converte este conceito numa tecnologia de leitura altamente sofisticada.


No século xviii, com livros mais portáteis e mais económicos, generaliza-se a leitura solitária. Contudo, isto regista-se em paralelo com a disseminação da Bíblia, fundamental para o crescer exponencial da literacia (nomeadamente nos países protestantes), cuja leitura era frequentemente um acontecimento familiar, em que a leitura intensiva se manifestava.


Um outro fenómeno é o crescimento da imprensa, estimulada pelo ensino académico e pelo reforçar das línguas vernaculares. A imprensa criou um dinamismo muito próprio, dando um nova velocidade à comunicação e normalizando a escrita graças aos jornais que saíam em grande quantidade das tipografias europeias.


Mais tarde, a máquina de escrever funcionará como um estádio intermédio entre a imprensa acessível à leitura de qualquer um e a quase total autonomia da era informática. Cada um pode prensar os seus pensamentos e ideias. Uma certa autonomia «de imprensa» começou por aí, mas a representação e a armazenagem continuavam no mesmo suporte. Essa tipografia pessoal, e o papel químico quando aplicado, fizeram de nós impressores em pequena escala, muitas vezes para consumo próprio. Cremos, porém, que terá sido importante no caminho para o sentimento de autonomia, de auto-importância da dignidade da nossa escrita. A digitalização, mais tarde, irá fazer a herege separação entre a armazenagem e a representação visual.


Escrever usando ferramentas digitais é hoje largamente predominante, e isto tem consequências na forma de pensar as palavras. Mesmo que a principal forma de chegar até às pessoas passe pelo livro impresso, que confere uma dignidade desconhecida num pdf.


Não é à toa que se fala da civilização do livro. A este devemos boa parte da forma como raciocinamos; porém, também nos transmite emoções, chegando ainda a tornar-se alvo de culto, no objecto da fé de increus. Uma fé que formou mentes e espíritos, e cuja crença torna mais difícil encarar o desaparecimento do livro tal como o conhecemos.


A forma como se escreve, e o suporte onde se regista a escrita, estão diferentes; com várias diferenças a surgirem quase ao mesmo tempo. Há uma multiplicidade de mudanças a acontecer em diferentes locais, num aparente caos evolutivo que se vai reunindo até se tornar noutra coisa. A invisibilidade dessas micro-evoluções dispersas dá a muitos saltos tecnológicos a aparência de um queimar de etapas.


Falamos de uma revolução que abana todas a estruturas, mas também a própria arquitectura da sociedade livresca tal como a conhecemos. O texto electrónico vem revolucionar todos os campos da edição «…é, ao mesmo tempo, uma revolução da técnica de produção e reprodução dos textos, uma revolução no suporte da escrita e uma revolução das práticas de leitura.» (Furtado).


Esse espírito implantou-se mais rapidamente na imprensa, onde podemos ver já a funcionar o que potencia a ruptura com o nosso pensamento. Somos bombardeados com conhecimentos fragmentados, proto-democratizados, verborreicos. O escrito quotidianiza-se, as pessoas lêem; as que não lêem, ouvem e vêem ler com mais assiduidade. O mundo parece acessível, mesmo que na verdade não o seja. As pessoas discutem mais tempo, mais longe e acompanhadas por mais pessoas. Conhece-se e cria-se a ilusão de que se conhece. Divulgam-se viagens, histórias, pensamentos, mas também mulheres barbadas e homens bárbaros. Eis-nos no mundo moderno.

16 abril 2009

Alívio...


...é o nome de uma gama de componentes de bicicleta da Shimano, mas também o que sinto agora, depois de entregar por fim os índices da Peregrinação! Foi cá um projecto... começou na primavera de 2006! Acaba assim uma época, a época em que sempre que me perguntavam o que é que andava a fazer, eu tinha de começar por dizer: "bem, ainda tenho pendentes os índices do Mendes Pinto".
*Suspiro*

03 abril 2009

Dangerous Cornwall


Fresh from the BBC!!

"Eileen Bishop, 87, from Perranporth, and her husband Anthony were on their way to church when, he said, she "disappeared off the radar".
Officers later found her heading along the A3075 towards Newquay.
A police community support officer (PCSO) rode the scooter back and said it appeared to be working correctly.
Mr Bishop said the incident began when he and his wife set off for St Michael's church.
He said the scooter, which "hadn't been going that well", was set to three-quarters speed.
"Suddenly she passed me at full tilt," Mr Bishop said.
"I shouted after her but she is a bit deaf. I couldn't chase her as I've had a triple heart bypass.
"She just disappeared off the radar."
Mr Bishop said he and a neighbour searched for his wife and then went to the police station to report her missing.
"I was just about in tears," he said.
Officers found Mrs Bishop after a motorist reported a mobility scooter "swerving" across the road near Pendown Cross, five miles away.
Mrs Bishop said she was not sure how she got separated from her husband.
"I just lost him. I was half asleep to tell you the truth," she explained.
It took PCSO Michael Ginnelly an hour to drive the scooter back to Perranporth.
"I think Mrs Bishop just gripped the controls and went too fast and held on for dear life," he told BBC News."

Desculpem lá voltar ao blogue com um copypaste, mas como vou passar cá a Páscoa, assim já vêem como é excitante a vida na Britain. O G20? Nem reparei.